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Democratização da Mídia

45 anos de resistência do jornal Conquista

Gustavo Cruz da Silveira - jornalista, editor de O Jornalecão

No dia 7 de novembro de 1969, as associadas do Clube de Mães Nossa Senhora das Graças, do bairro Tristeza, comemoraram o lançamento da primeira edição do jornal Conquista sem imaginar que 45 anos depois aquele gesto seria lembrado e reverenciado, já na segunda década do século 21. Pois o Conquista, informativo da entidade que resistiu ao tempo, mostrando que é possível circular com distribuição gratuita por décadas, fato que deve ser comemorado por todos que desejam uma comunicação democrática e plural. Sem grandes anunciantes, apenas com o apoio do comércio local, muitas mulheres do bairro Tristeza deram, entre 1969 e 2014, uma mostra de como a comunidade pode, se desejar e se empenhar nisso, manter uma publicação periódica por quase 50 anos.
Em 1987, sofremos uma influência indireta do Conquista, quando eu e outras crianças da Rua Oiampi, do bairro Guarujá (para juntar dinheiro para o campinho de futebol), iniciamos um despretensioso “jornalzinho da rua” sem saber que no futuro ele se transformaria em O Jornalecão, jornal de bairro referência da Zona Sul de Porto Alegre. O informativo do Clube de Mães Nossa Senhora das Graças naquela época já contava quase 20 anos de circulação e era distribuído, entre outros locais, no Colégio Mãe de Deus, onde estudei durante os dois primeiros anos de O Jornalecão (1987 e 1988), antes de retornar à Escola Professores Langendonck, onde concluí o 1º Grau. Quando cheguei ao Mãe de Deus, era distribuído gratuitamente o Conquista e começaria a circular, meses depois, o Alarido, informativo editado pela escola por muitos anos. Tendo acesso aos dois jornais do bairro Tristeza, a leitura de ambos nos deu algumas referências sobre como se comunicar com a comunidade, pois não jornais de bairro na Zona Sul para “nos espelharmos”; não conhecíamos os que começavam a circular em outros bairros da cidade e, além disso, os jornais de bairro pioneiros não circulavam mais naquela época. Não conhecíamos a história dos três jornais de fundados na Zona Sul antes de O Jornalecão: SABIdo (1954), Colméia (1967) e O Bairrista (1984), todos em Ipanema.
Mais tarde, nos anos 90, a jornalista Sandra Peretti Paixão, grande amiga que colaborou muito com O Jornalecão e também com o Conquista, sempre tinha à mão o jornal que ela ajudava a fazer e não nos deixava sem esta importante fonte de informação. Assim, ler o jornal do Clube de Mães do bairro Tristeza se tornou um hábito prazeroso ao longo dos anos. E uma alegria, por ver, 45 anos após a sua fundação, o Conquista próximo de chegar à marca de 350 publicações, com uma receita simples, que dezenas de jornais seguem em Porto Alegre: um jornal feito por pessoas da comunidade, que se doam para publicar nele as informações mais relevantes para a coletividade (sejam elas sobre o bairro ou mais gerais), e financiado por empresas e profissionais liberais da região. 
O que surpreende, no caso do Conquista, é a longevidade da publicação, por ser editado por uma entidade comunitária, ou seja, não é produzido por uma empresa, o que poderia facilitar seu desenvolvimento. Lançado em 7 de novembro de 1969 e tendo passado por diversas gestões do Clube de Mães Nossa Senhora das Graças, o Conquista sempre foi valorizado pelas administrações que se sucederam. Mesmo que cada uma delas desse uma “cara” um pouco diferente ao informativo, ele sempre seguiu a receita de noticiar e valorizar os acontecimentos do clube a que se destina, mas também buscando contribuições de voluntários do clube e da comunidade e a colaboração financeira de empresas da região, além de notícias de interesse dos moradores dos arredores.
Exatamente por não ser editado por uma empresa (o que facilitaria sua trajetória), o 45º aniversário do Conquista deve ser exaltado ainda mais. Além da luta diária de buscar recursos e produzir um jornal de qualidade para os leitores, que é comum aos jornais de bairro, para persistir até hoje o Conquista precisou que sucessivas gestões do Clube de Mães Nossa Senhora das Graças abraçassem a ideia, desde aquele longínquo 1969, mas também, e principalmente, do entusiasmo de mulheres que se revezaram ao longo de anos para lançar o jornal e fizeram da resistência do Conquista uma das grandes conquistas da Zona Sul.

Jornais de bairro de entidade também são raros

Apesar de diversas entidades terem seus informativos e outras lançarem jornais de bairro, é um caso raro na Zona Sul e também em Porto Alegre um veículo como o Conquista existir há tanto tempo. Na Zona Norte também circula um antigo jornal mantido por uma entidade, O Cristóvão, que em 2015 completará 30 anos e é editado pela Associação Cristóvão Colombo (ACC). Por pertencer a uma associação de moradores, nele são publicados conteúdos mais relacionados ao bairro Floresta (apesar de contar com matérias sobre a entidade) e, por isso, é considerado o jornal de bairro mais antigo de Porto Alegre. Todos os demais jornais de bairro da cidade que já circulam há mais de 20 anos são produzidos por empresas atualmente, o que facilitou seu desenvolvimento, por passar por menos mudanças de rumos, que podem acontecer a cada renovação de diretoria. Além de O Cristóvão, que é editado por uma entidade, o único jornal de bairro criado na década de 80 que não foi gerido por uma empresa desde os primeiros anos foi O Jornalecão, segundo jornal de bairro mais antigo da cidade em circulação, que foi fundado em 1987 por crianças que não podiam, por terem 11 anos ou menos, registrar uma empresa, o que só foi possível depois dos 18 anos de idade.

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